HUMANISMO EM MANUEL ANTUNES PARA UM PROJETO DE EDUCAÇÃO INTEGRAL NA CONSTRUÇÃO DO HOMEM TODO

Ana Lúcia Ferreira

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Universidade Aberta


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Resumo:


Com este artigo pretendemos apresentar as linhas mestras do pensamento pedagógico de Manuel Antu- nes (1918-1985), assente num humanismo de síntese, veiculado pelo ideário de educação total, do homem todo e de todo o homem. Considerado um dos pensadores mais importantes da cultura portuguesa do século XX, um pedagogo democrático, preocupado, desde sempre, com tudo o que é humano e com a humanização da própria Terra, Manuel Antunes imprime, no seu pen- samento, uma lógica interdisciplinar, transdiscipli- nar, dialogante, plural e aberta, de articulação de sa- beres, e de apelo à educação integral, humanista, en- quanto meio de emancipação e libertação, que promo- va a dignidade da pessoa humana. Inspirados no seu pensamento pedagógico, de educação integral, numa relação estreita com a cultura, aliado a um humanis- mo assente na complementaridade, apresentamos um projeto de treino do pensamento crítico e criati- vidade, tendo em vista a promoção de competências socioemocionais, potencializadoras de uma cultura de paz e de tolerância.


Palavras-chave:

Homem. Humanismo. Pessoa. Educação Integral. Pedagogia.

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DATA DE SUBMISSÃO: 2024/12/17

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DATA DE ACEITAÇÃO: 2025/07/28

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Abstract:


This article aims to present the main lines of the pe- dagogical thought of Manuel Antunes (1918-1985), ba- sed on a synthetic humanism, conveyed by the ideal of total education, of the whole man. Considered one of the most important thinkers of Portuguese cultu- re in the 20th century, a democratic pedagogue, al- ways concerned with everything that is human and with the humanization of the Earth itself, Manuel Antunes imprints in his thought an interdisciplina- ry, transdisciplinary, dialogic, plural, open logic, of articulation of knowledge, and of appeal to integral, humanist education, as a means of emancipation and liberation, which promotes the dignity of the human person. Inspired by his pedagogical thought, of inte- gral education, in a close relationship with culture, combined with a humanism based on complementa- rity, we present a project for training critical thinking and creativity, with a view to promoting socio-emo- tional skills, enhancing a culture of peace and tole- rance.


Keywords:

Man. Humanism. Person. Integral Education. Pedagogy.

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Pois bem, o homem que uns e outros revelam é, no fundo, o mesmo homem: com as mesmas capacidades, originárias, de pensar, de querer e de sentir; com as mesmas paixões e incertezas, as mesmas contradições e as mesmas dúvidas, as mesmas esperanças e as mesmas angústias. Variam, quase só, os contextos.

Manuel Antunes (2007a, p. 408)


Considerações preliminares

Manuel Antunes (1918-1985) é considerado um dos pensa- dores mais importantes da cultura portuguesa do século

XX. Toda a sua obra revela uma preocupação constante, relativamente à dignidade do ser humano, mediante uma educação total e permanente, centrada nos valores, naquilo que perdura, para além do que é circunstancial, da qual dependerá a sobrevivência da humanidade. Perante os desafios globais das sociedades hodiernas, os profissionais do atual mundo global e digital necessitam, além das competências técnicas, de um conjunto de com- petências globais, empreendedoras, que promovam o sentido de iniciativa, a criação de soluções para os proble- mas emergentes, e a potenciação de ideias inovadoras, no seio de uma formação integral. Uma vez que o Homem, na unidade e na diversidade que o compõem, resulta de um processo de construção social, evidencia-se, desde tenra idade, a importância do desenvolvimento destas competências, mediante processos de aprendizagem e de experimentação, inscritos no pensamento complexo e no pensamento global, que permitam educar para a era planetária.

Argumentamos que a educação de caráter humanista, assente numa formação integral, e na complementari- dade do particular e do universal, consubstanciada na vi- são de humanismo de Manuel Antunes, será um veículo primordial do despertar de uma consciência empreende- dora integral, que possibilite a capacitação de todo o ser humano e de cada ser humano no seu todo, conducente à promoção e efetivação de uma cultura de humanidade e de paz, e, consequentemente, a um caminho de susten- tabilidade humana e planetária.


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Humanismo de síntese

A conceção subjugada ao conceito de humanismo é muito antiga, tendo sido descrita no pensamento do sofista Protágoras, em meados do século V a.C. “o homem é a medida de todas as coisas” (Antunes, 1970, p. 582). Segundo Manuel Antunes, “um pensador da complexidade do seu tempo” (Fiolhais, 2022, p. 887), há diversos humanismos, consoante as várias conceções do homem, com lugar, ou não, para o sobrenatural, posicionando-se, este, a favor do humanismo integral1 e dialogal.2 Neste sentido, o autor estabelece uma relação de complementaridade entre o Humanismo Clássico e o Humanismo Moderno, na procura de um caminho de aperfeiçoamento do homem no mundo, sendo que o mundo também o habita e o compõe – “O homem é um ser do mundo para o mundo” (Antunes, 2008a, p. 104), numa profunda correspondência entre o macro e o micro. Assim, à razão e contemplação, próprias do Humanismo Clássico dos séculos XV e XVI, com uma insistência marcada do passado, alia a técnica e a ciência, características do Humanismo Moderno, desde a segunda metade do século XVIII, valorizando o futuro, colocando em diálogo o qualitativo e o quantitativo, o subjetivo e o objetivo. De facto, procura contornar as divisões estanques que “separam hoje o homem do homem” (Antunes, 2007a, p. 314), integrando, de forma complementar, a racionalidade e a espontaneidade, aspirando uma “época de síntese” (Antunes, 2007a, p. 314), de diálogo permanente entre o particular e o universal.

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Aliada à sua mentalidade prospetiva, Manuel Antunes defende o humanismo como visão, já que “aqueles que melhor souberem prever são os que em melhores condições se encontrarão para agir” (Antunes, 2007a, p. 314). Uma visão do homem na promoção da sua dignidade, numa perspetiva global, integrando a crença e a ciência, a razão e o mito, a arte e a história, decorrente da indefinição do ser humano, o que implica, naturalmente, uma ação, e, por isso, uma formação, uma pedagogia,


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  1. – Atente-se à definição de “homem aberto” de Manuel Antunes, aquele que «não exclui que o homem venha a ser aperfeiçoado nas suas virtualidades ou cumulado em certas das suas aspirações mais fundas por uma revelação gratuita», traduzindo o seu humanismo integral. In Manuel Antunes (2000) «Humanismo, CULT.», Enciclopédia Verbo Luso-Brasileira de Cultura, Edição Século XXI, vol. 15, 131-133.


  2. – Sobre este assunto, ver Luís Filipe Barreto (1985), «Manuel Antunes (1918-1985): um Humanismo Dialogal», in Jornal de Letras, Nº 133, 22 a 28 de Janeiro, 9.

    que integre, necessariamente, os dois contextos inerentes ao ser humano: o existencial e o racional, “dada a impensabilidade actual de uma humanidade sem ciência e dada a impossibilidade da ciência sem uma humanidade que a anime” (Antunes, 2007a, p. 316). Daqui resulta, naturalmente, a defesa de “um humanismo de inserção no mundo” (Antunes, 2007b, p. 204), com vista à transformação desse mesmo mundo, baseada num diálogo vital entre factos e valores, procurando entender o humanismo como invenção, assente na afetividade, enquanto impulsionadora do progresso técnico e científico, algo que o humanismo moderno, por si só, na conceção de Manuel Antunes, tende a descurar.

    Efetivamente, indivíduo e comunidade, interioridade e exterioridade, ação e contemplação, particular e universal, compõem o homem na sua totalidade, que é, em si mesma, una e diversa. Sendo o homem imbuído de historicidade, e não havendo humanismo sem homem, “só ela pode situar o homem na sua pátria essencial”, (Antunes, 2007a, p. 319) na complementaridade vital dos dois humanismos, por forma a combater a época de crise que vivemos, “aparentemente sem centro de gravidade, sem direcção, sem sentido” (Antunes, 2007a, p. 365), sobretudo do ponto de vista existencial e cultural.

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    Humanismo personalista

    - a misericórdia como humanismo de esperança

    Para Manuel Antunes, em linha com a filosofia tomista,3 o homem é acima de tudo pessoa, dotado de consciência e de liberdade, ainda que seja parte de um todo, enquanto indivíduo. E por ser pessoa é um ser diferente de todos os outros seres, superior, porque só ele pensa o todo e as partes, só ele pode estabelecer

    o equilíbrio entre o uno e o múltiplo, porque assim

    o é. Assim, o autor defende um humanismo que permita uma existência permeada de autenticidade que se torna possível dada a condição de pessoa do ser humano, advinda da sua matriz cultural: “O homem nasce indivíduo e forma-se pessoa” (Antunes, 2008b, p. 130), defendendo um “Humanismo personalista” (Antunes, 2009, p. 53), um humanismo de integridade, traduzido num equilíbrio de opostos, de alteridade, uma vez que o Homem, para se tornar homem precisa dos outros. Assim, a socialidade, algo de ínsito ao ser humano, só adquire a sua forma plena e autêntica, mediante a socialização, implicando a abertura ao Outro, ao diferente, num diálogo plural, mediado pela educação, assente em direitos e deveres. É, pois, a cultura que confere ao Homem a possibilidade de ser homem, detentor de consciência e de liberdade.

    Atente-se que a ‘pessoa’ a que Manuel Antunes se refere nada tem que ver com o ser individualista, alicerçado num humanismo individualista, no caminho da autorrealização e autoaperfeiçoamento. Ser ‘pessoa’ só se concretiza numa efetiva sociedade do diálogo4. De igual forma, o objeto “Homem” não é passível de ser fragmentado, já que se trata simultaneamente “de um objecto-sujeito, de um


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  3. – Note-se que, Manuel Antunes estabelece uma síntese entre o tomismo e o marxismo, definindo dois tipos de homem e consequentemente dois realismos: o humanismo tomista – espiritualista, metafísico, no caminho da transcendência, mediado pelo diálogo da razão e da fé; e o humanismo marxista, materialista e pragmático, no caminho da imanência, mediado pela procura da reconciliação do homem com o homem e do homem com a natureza; ambos com acentuações diversas fundadas num só realismo. A síntese reside no «humanismo personalista, cósmico e histórico, de interioridade e exterioridade, de personalidade e comunidade, de acção e contemplação, de símbolo e de razão, de ciência e de mistério, de trabalho natural e de graça sobrenatural», Manuel Antunes (2008a) «Tomismo e Marxismo»», in Obra Completa do Padre Manuel Antunes, tomo I Theoria: Cultura e Civilização, vol. III Filosofia da Cultura, Coordenação Científica de Luís Machado de Abreu, Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, p. 192.


  4. – Ver José Acácio Aguiar de Castro (2021), «Interpelações à Teologia na obra do Padre Manuel Antunes», Ephata, 3, nº. 1, pp. 115-135.

    objecto-pessoa” (Antunes, 2008a, p. 59) construtor de uma existência individual e coletiva, o que implica, necessariamente, uma antropologia completa que respeite as diferenças na unidade, do ponto de vista físico, moral, individual, coletivo, histórico e filosófico. Desta forma, numa época em que tudo tende a seguir a observação e experiência científicas, é importante atentar, não só à estrutura ou sistema, mas, sobretudo, à génese, à existência, ousando fazer prevalecer a reflexão ontológica, extravasando limites e fronteiras, esbatendo dicotomias polarizadas.

    Numa época em que o homem vive momentos de desorientação e ansiedade, e, num espaço onde “ter, sobra” (Antunes, 2008b, p. 197), “urge restabelecer o equilíbrio, urge re-interiorizar o homem” (p.137), na procura de uma humanização humanizante, dado o contexto de desenraizamento em que o homem se encontra. Por isso, o autor apela ao despertar da juventude para estas questões, no sentido de compreender que um homem desenraizado será, naturalmente, um homem menos humano, logo, “há que chamá-la à responsabilidade que é a personalização”, (p. 269), no seio de um legado recebido, capaz de superar o narcisismo e a alienação, “porque se o Homem se põe, opondo-se, o Homem completa-se, coexistindo e integrando-se” (Antunes, 2009, p. 52), no caminho de uma cultura de diálogo e de sensatez. Mais uma vez, a cultura tem como finalidade “servir a pessoa humana” (Antunes, 2007b, p. 175), encontrando-se, plenamente, ao serviço da dignidade do Homem. Para que tal aconteça, Manuel Antunes, apela a uma “renascença” (Antunes, 2008c, p. 44), assente no dever ser, na consciência do Outro, numa reflexão fecunda e conciliadora da unidade e diversidade, sendo, para tal, necessária uma revolução moral, que acompanhe a revolução política, social e cultural, “que ensine a conjugar justiça e solidariedade, liberdade e honestidade” (p. 46), compreendendo o todo e as partes, assim como as suas interfecundações, alicerçada no valor da pessoa humana. De igual forma, é preciso conjugar, de forma harmoniosa, direitos e deveres, com sentido de responsabilidade, de exigência na formação em detrimento da informação, no primado da comunidade ao invés da sociedade.

    Numa época de crise, no caminho da justiça, liberdade, e igualdade, Manuel Antunes enaltece, de forma particular, o direito e o dever da educação e da cultura,5 propondo-nos a superação do indivíduo

    atomizado, abstrato, alienado da sociedade, a superação do “homem-espuma” pelo “homem de misericórdia”, pelos homens e mulheres que, atribuindo valor a si próprios, por meio da educação e da cultura, atribuam igualmente valor ao Outro, próximo ou distante, mediado pelo espírito da solidariedade e do amor que deverá presidir a toda a humanidade (Franco & Autor, 2024, p. 460). Neste sentido, o homo misericors,6 tal como é concebido por Manuel Antunes, tem um papel importante de conciliação e de equilíbrio, na medida em que surge da vontade de o homem sair de si mesmo, de se libertar, num caminho de permanente reciprocidade, contribuindo para o processo de desalienação, com base numa conciliação da misericórdia e da técnica. “Sem ciência e sem técnica, a Humanidade não pode subsistir; sem misericórdia, ela não pode subsistir humana” (Antunes, 2008b, p. 92). É, pois, pela misericórdia que o homem pode mudar o seu sentido na terra, na permanente abertura ao Outro, na procura do todo em cada parte, para que consiga evoluir da “multidão solitária”, que se traduz num “conjunto de homens unidimensionais numa sociedade multidimensional” (Antunes, 2008b, p. 191), contrariando o individualismo, que faz diminuir a consciência histórica e a consciência coletiva, em prol do bem comum. Trata-se, assim, de um “homem de Esperança” (Antunes, 2007b, p. 17), promovendo um humanismo fundado na esperança.

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    “Ciência e sabedoria, prudência e audácia, discernimento crítico e sentido do possível, uma certa capacidade profética e uma visão certa da história” (Antunes, 2008b, p. 208) serão, efetivamente, linhas orientadoras de um caminho a percorrer entre o uno e o múltiplo, o particular e o universal, no qual os valores assumam lugar de destaque, “para que contra o homem-espuma possa vingar o homem todo e todo o homem” (Alves-Jesus, 2022, p. 946), num processo de aperfeiçoamento permanente, de liberdade e de consciência, na promoção da dignidade humana.


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  5. – Ver «Da educação como poder numa época de crise», in Manuel Antunes (2008b), Obra Completa do Padre Manuel Antunes SJ, tomo II: Paideia, Educação e Sociedade, (2ªed.), coordenação científica de José Eduardo Franco, Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, p. 152.

Cultura e educação na construção do humanismo dialogal

Manuel Antunes procura promover o desenvolvimento harmonioso e equilibrado do ser humano – “seres conscientes de que agir sobre o mundo é agir sobre

o homem e de que agir sobre o homem é agir sobre

o mundo, eis o que visa a conjugação dos dois humanismos, clássico e moderno”, (Antunes, 2007a, p. 320), assente num humanismo de diálogo, de conciliação, mediado pela educação integral e educação permanente,“aquela que concerne o homem todo e todo o homem” (Antunes, 2008b, p. 110), naquilo que diz respeito a todas as dimensões da sua personalidade, que lhe permita pensar o todo em que habita, com todas as aspirações individuais inseridas numa pertença coletiva. A complexidade resulta, assim, da integração da unidade e multiplicidade, logo “uma educação ou é total ou simplesmente não é” (p.175), que promova uma formação integral, total, centrada naquilo que é a condição humana da era planetária, na inter e transdisciplinaridade,7 reconhecendo e valorizando a diversidade cultural.

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Manuel Antunes defende, pois, um saber articulado, não fragmentado, onde a interdisciplinaridade8 sobressaia como característica primordial na construção de “uma antropologia completa: física e moral, paleontológica e etnológica, histórica e filosófica, compreensiva e explicativa; individual e colectiva” (Antunes, 2008a, p. 60), que traduz a totalidade do homem, uma vez que “todo o homem pelo facto de o ser, é um ser de cultura” (Antunes, 1999, p. 746), valorizando, naturalmente, a unidade na diversidade. Uma totalidade “em marcha” (Antunes, 2011, p. 95) enquanto produto e produtor de cultura, enquanto ser histórico particular e universal,

dotado de consciência e de liberdade, o que requer uma compreensão dialética e integral.

A educação ocupa, assim, um lugar primordial na obra de Manuel Antunes, para a consolidação de uma sociedade democrática, na medida em que “sem o poder da educação, todos os outros poderes correm o risco de se tornarem vãos ou até nocivos” (Antunes, 2008b, p. 155). Uma educação em abertura plena a tudo a que é humano, de forma, verdadeiramente, inclusiva e prospetiva, permanente, aliada à premissa de“formar para imaginar para edificar” (p.118), contrariando uma pedagogia setorizada, alienante, tendendo para a homogeneização (Alves-Jesus & Autor, 2024). A educação permanente permitirá uma maior simbiose com a sociedade, sendo a educação um “processo sempre in fieri […] na convicção de que, se não nos fizermos, seremos feitos” (Antunes, 2008b, p. 115). De facto, evidencia-se o primado da formação sobre a informação, que tenda para um diálogo universal que exija o reconhecimento da singularidade e da diferença, abrindo caminho para uma cultura efetivamente dialogal.

Preocupado com o homem e com o ser homem no todo que é, e uma vez que “o homem realiza-se enquanto homem pela educação” (Dimas, 2019, p. 173), Manuel Antunes concebe a problemática da educação, consubstanciada na sua relação estreita com a cultura e a sociedade, enquanto facto, necessidade e dever. Fala-nos, pois, de uma educação que privilegie a relação dialética entre a ciência e a sabedoria, bem como entre os factos e os valores. Entende que “educar é agir, actuar, sobre o cerne do humano, do próprio homem, do homem singular e único que é a pessoa de cada um” (Patrício, 2007, p. 268), concebendo a educação, enquanto ação, no todo que o homem é, promovendo e construindo valores, uma vez que “o homem da era planetária sente grande dificuldade em encontrar-se, em identificar-se, em fixar-se” (Antunes, 2008b, p. 179). Desta forma, o projeto educativo9 é, ele próprio, “um projecto de cultura, um projecto de homem e de sociedade a construir” (Franco, 2008, p.8), o que faz com que a educação vá muito para além daquilo que é o domínio escolar, integrando a construção de um projeto de formação


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  1. – Ver a análise de Marcos L. Mucheroni & Adérito Fernandes-Marcos (2022). «Traços transdisciplinares na obra do Padre Manuel Antunes: uma análise crítica à luz da Carta da Transdisciplinaridade /UNESCO-1994». In Franco, J. E. & Martins, G. O. (coord.). Repensar Portugal, a Europa e a Globalização: Saber Padre Manuel Antunes, SJ - 100 Anos (1ªed.) (pp.593-602). Coimbra: Imprensa da Universidade de Coimbra.


  2. – Ver a definição de «interdisciplinaridade», in Manuel Antunes (2008b), Obra Completa do Padre Manuel Antunes, tomo II, Paideia, Educação e Sociedade, pp.144-146.


  3. – Ver a análise de Leonel Ribeiro dos Santos (2022), «Manuel Antunes, filósofo da educação.», In Repensar Portugal, a Europa e a Globalização. Saber Padre Manuel Antunes, SJ - 100 Anos, Coimbra, Imprensa da Universidade de Coimbra, pp. 291-317.

    integral do ser humano, salientando-se a importância de saber projetar, planificar, no contexto presente, perspetivando o futuro, aliada às capacidades de compreensão, de adaptação, de discernimento crítico, reflexão, criatividade e invenção, assente na imaginação, para que o homem consiga viver como homem e consiga dialogar, no seio das várias culturas do mundo global.“Só assim é que o homem conseguirá ser o artífice do seu próprio destino. Só assim é que o homem poderá ir humanizando a Terra” (Antunes, 2008b, p. 120), num caminho de existência autêntica, encontrando formas de suprir a crise de valores da sociedade contemporânea.

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    A primazia das ciências humanas na promoção de uma existência au- têntica integral

    Manuel Antunes salienta a importância de pensar sobre o quadro de valores, para que o homem cami- nhe para uma existência integral, baseada naquilo que é permanente - a verdade, a justiça, a beleza, a bondade, o conhecimento, assentes nos princípios de Cícero: “gravitas, pietas, simplicitas” (Antunes, 2008b, p. 105), veiculados por uma educação interdisciplinar, centrada no que perdura, para além do que é circuns- tancial. Desta forma, a questão dos valores, em maté- ria de educação, é a questão, pois, “só assim o homem se sentirá implicado, envolvido, responsabilizado” (p. 123), na busca de uma felicidade coletiva que contem- ple o Outro na diferença e na multiplicidade.

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    A autenticidade surge, em Manuel Antunes, como uma exigência moral de grande relevo, tendo a sua génese na pessoa humana, detentora de consciência e de liberdade, concretizando-se numa sociedade ver- dadeiramente dialogal, de abertura à transcendência, permitindo “fazer a verdade, toda a verdade e só a ver- dade” (Antunes, 2008a, p. 53) - o caminho efetivo para uma existência autêntica. Assim, por forma a efetivar este caminho de autenticidade, insiste na primazia das ciências humanas10 sobre as ciências da natureza, que permita ao homem conhecer-se a si mesmo, em profundidade de Ser, na primazia daquilo que é per- manente, “o eterno do homem: as suas aspirações à verdade, à justiça, à bondade, à beleza, ao conheci- mento; a sua vontade de essencial” (Antunes, 2008b, p. 124), inscrevendo a base da educação nos valores.


    Sendo assim, educar para amanhã não será tanto formar homens para a ciência e para a tecnologia quanto formar homens que, pela ciência e pela tecnologia e, mais além da ciência e da tecnologia, sejam humanistas, filósofos, moralistas, orga- nizadores e animadores espirituais de um mun-


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  4. – Ver a análise de Onésimo Teotónio Almeida (2022), «Padre Manuel Antunes, humanista e paladino das humanidades.», In Repensar Portugal, a Europa e a Globalização. Saber Padre Manuel Antunes, SJ - 100 Anos, Coimbra, Imprensa da Universidade de Coimbra, pp.357-362, e Artur Manso (2022), «Manuel Antunes. O lugar das humanidades no futuro da educação.», In Repensar Portugal, a Europa e a Globalização. Saber Padre Manuel Antunes, SJ - 100 Anos, Coimbra, Imprensa da Universidade de Coimbra, pp.445-461.

do que pode não chegar a saber em que empregar a própria riqueza material como hoje, em parte, já o não sabe (Antunes, 2008b, p. 131).


Uma vez que “não há mundo sem homens” (Manso, 2022, p. 447) e são eles que ditam os valores e edificam culturas e civilizações, numa relação ten- sional entre imanência e transcendência, dada a sua finitude e necessidade de absoluto, há que conjugar, de forma efetiva e complementar, as ciências naturais e exatas com as humanidades, num todo absoluta- mente recíproco e dialogal. “Compreensão e Persona- lização” (Castro, 2021, p. 126) constituem, pois, a base do equilíbrio do existir social que não pode descurar o vínculo da ética. São as humanidades que permitem situar o homem na sua história, num diálogo entre o passado e presente, projetando o futuro, ajudando a potenciar o ser em consciência e em liberdade, no seio de uma formação humanística, integrando a filo- sofia, as artes, a literatura, os valores.

Efetivamente, a educação, para Manuel Antunes, para além de transmitir cultura, cria condições para o emergir de novas formas de cultura, sendo esta “tradi- ção e diálogo, especialização e interdisciplinaridade” (Antunes, 1980, p. 8), assumindo-se como a “pedago- gia do humano” (Patrício, 2018, p. 545), em que as hu- manidades assumem um lugar de especial destaque, uma vez que “A humanitas é aquilo que forma o homem como homem” (Miranda, 2018, p. 563), num “conti- nuum histórico” (Antunes, 2008b, p. 154), ainda que mutável, aliada a um dinamismo constante, inerente à vida humana. “Esta educação deve visar a constru- ção do homem todo, do homem integralmente for- mado, na linha do ideal da consecução do humanis- mo integral” (Franco, 1999, p. 294), que permita fazer sobressair aquilo que melhor define o homem, “uma consciência e uma liberdade”, como um ser “em-si” (Antunes, 2009, p. 51), ou seja, como pessoa.

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Desta educação, centrada na questão dos va- lores e de uma existência autêntica de- penderá a sobrevivência da Humanidade.

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Proposta para uma intervenção junto dos alunos do 1º ciclo do ensi- no básico

Inspirados no pensamento pedagógico humanista de Manuel Antunes, assente na defesa de uma educação integral, na questão dos valores, construímos e imple- mentámos um projeto de treino do pensamento críti- co e criatividade PENSAR E PERGUNTAR – a minha opinião conta! (PP), no âmbito do Programa Municipal de Po- tenciação do Sucesso Escolar do Município de Pombal, junto dos alunos do 4º ano do 1º ciclo do ensino bási- co, da rede de ensino público do concelho de Pombal, com vista a potenciar competências socioemocionais, designadamente o pensamento crítico, a criatividade, a empatia, a comunicação assertiva, e o trabalho co- laborativo.

De acordo com o Relatório Técnico do Conselho Nacio- nal de Educação – Perfil do aluno, competências para o século XXI (Faria et al, 2017), uma vez que o conhecimento é disponibilizado a uma velocidade e quantidade con- sideráveis, torna-se importante priorizar as formas de alcançar e selecionar a informação. Assim, o pen- samento crítico e o pensamento criativo afiguram-se como competências centrais em todo o processo de ensino/aprendizagem. Conhecimento e competências apresentam-se interrelacionados, segundo uma óti- ca multidimensional e transversal. De acordo com a OCDE (2015), o sistema educacional do século XXI deve contribuir para a potenciação de diversas competên- cias que permitam aos alunos enfrentar os múltiplos desafios de uma sociedade globalizada e complexa, designadamente a criatividade e o pensamento crí- tico. Neste sentido, os alunos deverão treinar com- petências não automatizadas, por forma a proporem soluções adequadas e eficientes aos problemas encon- trados, na medida em que, no futuro, será valoriza- da não tanto a informação, mas, sim, a sua aplicação criativa e crítica a situações novas.

No âmbito do estudo “Fostering Students` Creativity and Critical Thinking - what it means to school” (Vin- cent-Lancrin et al. 2019), as capacidades de criar, ima- ginar e pensar criticamente são fundamentais para a construção de cidadãos ativos e conscientes, em tem-

pos de elevada incerteza e imprevisibilidade. A cria- tividade surge enquanto competência que envolve a construção de ideias e de processos que contribuem para soluções efetivas, relativamente a determinada problemática. Por sua vez, o pensamento crítico surge enquanto competência promotora de uma tomada de posição racional e analítica, face a diversas situações do quotidiano, potenciando a problematização e a res- significação da informação, atendendo a componen- tes cognitivos e socioemocionais. De notar que, o pen- samento crítico não é natural, mas, sim, potenciado pelo ensino, no sentido do treino e aperfeiçoamento (Halpern, 1996). Assim, afigura-se de toda a pertinên- cia estimular o pensamento crítico e criatividade, so- bretudo nos primeiros anos de escolaridade, por forma a potenciar a capacidade de resolver problemas, dan- do respostas ajustadas às situações da realidade quo- tidiana de uma sociedade democrática, uma vez que o pensamento crítico assume-se como pedra basilar na formação integral do indivíduo (Tenreiro-Vieira, 2001), no âmbito da educação global. De acordo com a Declaração Europeia sobre Educação Global (2022), a “Educação Global é a educação que possibilita às pes- soas refletir criticamente sobre o mundo e o seu lugar no mesmo” (p.2). É um conceito multidimensional que surge como “resposta colectiva e holística” (p. 20), no seio das sociedades globalizadas para a construção de um mundo mais justo, sustentável e coeso, permi- tindo a aquisição de conhecimentos, competências, valores e atitudes, potencializando ao máximo as ca- pacidades dos indivíduos.

Em linha com o conceito de educação integral, de Manuel Antunes, defende-se uma educação verda- deiramente transformadora, promotora do “desenvol- vimento holístico” (UNESCO, 2022, p. 2) de todos os alunos, ao longo das suas vidas. Uma educação glo- bal apoiada no aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a viver juntos e aprender a ser, que permita a construção da cidadania por estratégias e métodos participativos (Cabezudo et al., 2010), o que implica, de acordo com a UNESCO (2022), uma transformação dos sistemas de educação pela criação de ambientes de aprendizagem que apoiem o desenvolvimento de todos os alunos, capacitem os professores, para que se tornem agentes de mudança e aproveitem a revo- lução digital em benefício da educação pública.

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Objetivos

e metodologia

O PP tem como objetivo geral promover o questiona- mento e a reflexão da realidade quotidiana, no âmbi- to de uma abordagem sociológica, valorizando e utili- zando a informação e o conhecimento produzidos no e pelo Mundo, assentes na diversidade e pluralidade, potencializando o desenvolvimento de competências socioemocionais, privilegiando a articulação com o professor titular de turma e o envolvimento e parti- cipação das famílias/cuidadores em todo o processo, conducente a uma cultura de paz e de tolerância.

Como objetivos específicos, o PP pretende promover o pensamento crítico, refletindo e explicando situações do quotidiano sobre a realidade ambiental, social, cultural, económica, política e digital; desenvolver a técnica do questionamento e argumentação; desen- volver a técnica da escuta-ativa; desenvolver a téc- nica do brainstorming; exercitar práticas de pesquisa e investigação; promover a imaginação, a criatividade na análise crítica; desenvolver uma atitude de comu- nicação assertiva; promover o trabalho cooperativo e de inclusão, exercitando a empatia, o diálogo, a valo- rização da diferença e do pensamento divergente.

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O projeto, ao longo da sua dinamização, integra uma lógica triangular de atuação - Escola - Aluno/a – Famí- lia, por forma a potenciar o envolvimento de todos na reflexão e discussão, no âmbito da temática escolhi- da, em contexto escolar/familiar. É operacionalizado em 12 sessões, em contexto de sala de aula/turma, com duração de 60 minutos/sessão, durante o perío- do letivo, em articulação com o professor titular. As sessões são dinamizadas, de forma dinâmica e inte- rativa, com vista a potenciar, sistematicamente, o treino das competências pré-definidas. São utiliza- das, essencialmente, as técnicas de role playing, dinâ- micas de grupo, entre outras, privilegiando o treino da criatividade, do pensamento crítico, da empatia, do trabalho colaborativo e da comunicação assertiva, segundo uma metodologia participativa. Evocam-se o conhecimento e as experiências de cada um; reali- zam-se breves exposições, privilegiando-se mais a ver- tente experiencial do que a teórica; disponibiliza-se material didático sobre a temática e competências em causa, privilegiando-se a dinâmica de grupo. Além do trabalho realizado ao longo das sessões, convidam-se os alunos a trabalhar em contexto familiar, sobre a temática e competências exercitadas em contexto es-

colar. Pretende-se criar momentos de aprendizagem e treino das competências socioemocionais, de forma divertida, que permitam alcançar os objetivos pré-de- finidos do projeto.

O projeto encontra-se estruturado em 6 módulos orientadores: “Observar e selecionar”, para observar e explorar algumas situações-problema do quotidia- no, de diversas áreas (ambiental, social, cultural, económica, política, digital), elaborando questões e selecionando a grande questão a trabalhar; “Pensar e perguntar”, para refletir sobre a questão selecionada, treinando a técnica do questionamento, a escuta-ati- va, o trabalho cooperativo, a empatia e a comunicação assertiva, valorizando a diferença e a diversidade de olhares e interpretações sobre a mesma situação-pro- blema; “Analisar e argumentar”, para exercitar práti- cas de pesquisa, dialogar em grupo sobre o trabalho realizado em contexto familiar, partilhando soluções criativas para a resolução de problemas identificados; “Criar”, para construir a apresentação final de

todo o trabalho realizado, em contexto escolar e em contexto familiar, promovendo a imagi- nação e a criatividade, “Apresentar”, para exer- citar a expressão oral em grande grupo (alunos do 1º ciclo, encarregados de educação, docentes, auxiliares de ação educativa, direção do agru- pamento de escolas, representantes do Municí- pio); “Avaliar”, para aferir o grau de satisfação dos alunos, das famílias, do professor titular de turma, através do preenchimento de questioná- rios de satisfação.

O PP procura, sobretudo, treinar o pensamen- to crítico, a criatividade, a empatia, o trabalho cooperativo e a comunicação assertiva, compe-

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tências promotoras de uma cultura de paz e de tole- rância, exemplificando e exercitando as mesmas, me- diante dinâmicas de grupo. No ano letivo 2023-2024, o PP foi implementado numa escola de 1º ciclo do en- sino básico, junto da turma do 4º ano de escolarida- de, num total de 22 alunos, subordinado à temática o sucesso e a felicidade na escola- a minha escola é uma escola feliz?

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Objetivos

e metodologia

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O professor titular de turma refere que o projeto foi bastante importante, considerando uma grande mais-valia para os alunos o facto de terem participado no mesmo. Considera, de igual forma, que o projeto contribuiu, bastante, para potenciar uma relação positiva em contexto familiar e estreitar a ligação família-escola. Salienta o facto de o projeto promover, bastante, o trabalho colaborativo, a comunicação assertiva e o pensamento crítico, contribuindo para aumentar o sucesso e a felicidade dos alunos em contexto escolar. Relativamente às potencialidades do projeto, identifica “a discussão e partilha de ideias, e o estar atento à realidade”. No que diz respeito aos aspetos a melhorar no projeto, não verifica a sua existência.


Gráfico 1 – Questionário de Satisfação professor titular


Os encarregados de educação, de uma forma geral, consideram que o projeto foi bastante importante, considerando uma grande mais-valia os alunos terem participado no mesmo. Consideram, de igual forma, que o projeto contribuiu, muito, para potenciar uma relação positiva em contexto familiar e estreitar a ligação família-escola. Salientam o facto de o projeto promover, muito, o trabalho colaborativo, a comunicação assertiva e o pensamento crítico, contribuindo para aumentar o sucesso e a felicidade dos alunos em contexto escolar. Relativamente às potencialidades do projeto, os encarregados de educação expressaram o seguinte: “Ajuda na comunicação das crianças a ser feliz na escola”; “Através do projeto, os alunos viram como é importante respeitar os colegas, os professores e todos os que

trabalham na escola, assim como os bens materiais”; “As outras crianças ir ver o projeto para se respeitarem uns aos outros”; Aproximação das crianças aos pais, aumento do trabalho em equipa”; “Discussão de ideias, trabalho em grupo”; “Estímulo do pensar e saber estar em sociedade”; “Exercício mental, respeito pela opinião dos outros”; “O desenvolvimento a falar e a união entre os grupos”; “Valorização pessoal, aprendizagens”.


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Gráfico 2 – Questionário de satisfação famílias


Os alunos gostaram, bastante, de participar no projeto, considerando que aprenderam coisas novas, o que contribuiu para aumentar a sua felicidade. No futuro, gostariam de participar em mais projetos como o PP. Relativamente ao que mais gostaram, ao longo das sessões, os alunos expressaram sobretudo: “trabalhar em grupo”; “escrever um poema”; “gostei mais da pergunta o que é ser feliz na escola”; “de desenhar”. Por outro lado, relativamente ao que menos gostaram, alguns evidenciaram o “ter de desenhar”.


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Gráfico 3 – Questionário de satisfação alunos 1

Considerações finais

Da análise da avaliação de satisfação, consideramos que o PENSAR E PERGUNTAR - A minha opinião conta! foi percecionado, pelos vários intervenientes, como ten- do particular importância, no que diz respeito ao trei- no do pensamento crítico e criatividade, potenciando comportamentos pró-sociais, ao procurar promover competências socioemocionais, em linha com a Agen- da 2030 da UNESCO, particularmente no que diz res- peito ao ODS (Objetivo de Desenvolvimento Sustentá- vel) 4 : Educação de Qualidade, e com o Perfil do Aluno à Saída da Escolaridade Obrigatória (PASEO), alicerça- das no paradigma da educação integral humanista, potenciadora de uma cultura de paz e de tolerância, com vista ao sucesso educativo e bem-estar integral dos alunos. Assim, este projeto enquadra-se no pen- samento pedagógico de Manuel Antunes, refletido no conceito de humanismo personalista, mediado pela educação integral, e na formação de um novo modelo de homem, baseado na integridade da pessoa huma- na, numa dialética dialogante com o Outro, numa re- lação de reciprocidade assente na misericórdia.

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Manuel Antunes pugnou por um mundo onde todo o homem, independentemente da sua raça, religião ou nacionalidade, pudesse viver uma vida plenamente humana, em que os direitos humanos fossem, efeti- vamente, a base da ação política. Hoje, a reflexão de Manuel Antunes continua a oferecer-nos chaves de leitura, para compreender melhor o mundo atual, nas suas mais diversas perspetivas, filosóficas, políticas, religiosas e culturais. A intemporalidade manifes- ta do seu pensamento ressoa para todos aqueles que queiram, também, olhar para o tema da educação, da cultura, da dignidade da pessoa humana, sob a pers- petiva do insigne jesuíta, e encontrar nesta mais uma ferramenta em defesa de uma humanidade mais jus- ta e fraterna, mediante a educação, enquanto facto, necessidade e dever, que ajude o homem a humani- zar-se e a humanizar o planeta no qual habita.

Na dinâmica social contemporânea, é preciso que o homem tenha tempo e disponibilidade para contem- plar, conhecendo-se em profundidade, olhando-se no Outro. Efetivamente, a compreensão mútua constitui um alicerce primordial do humanismo personalista dialogal, que interligue, de forma harmoniosa, pes- soas e coisas, mediada pela educação total, integral, na formação de um novo modelo de homem, basea-

do na integridade da pessoa humana, numa dialética dialogante com o Outro, numa relação de reciprocida- de assente na misericórdia, em valores de permanên- cia promotores da dignidade da pessoa humana.

Este será o caminho para uma existência autêntica, podendo cumprir-se, assim, um dos grandes desafios morais do nosso tempo.

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Referências bibliográficas sobre o Projeto de treino do pensamento crítico e criatividade PENSAR E PERGUNTAR – a minha opinião conta!


Cabezudo, A. et al. (2010). Guia prático para a educação global: Conceitos e metodologias no âmbito da educação global para educadores e decisores políticos. Centro Norte-Sul do Conselho da Europa. Acedido a 12 de maio de 2022 em: https:// rm.coe.int/168070eb92

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Halpern, D. (1996). Thought & Knowledge: An Introduction to Critical Thinking. New Jersey: Lawrence Erlbaum Associates.

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Tenreiro-Vieira, C. & Vieira, R. (2001). Promover o Pensamento Crítico nos Alunos: Propostas Concretas para a Sala de Aula. Porto: Porto Editora.

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Referências bibliográficas de Manuel Antunes

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Antunes, M. (2008a). Obra Completa do Padre Manuel Antunes, SJ, Tomo I, Theoria: Cultura e Civilização, Vol. III. Filosofia da Cultura (2ªed.), coordenação científica de Luís Machado de Abreu. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian.

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